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casa vitoriana:adoro coisas velhas |
eu gosto de coisas velhas. acho até que já disse isso por aqui, em algum momento. e tome por velho as coisas antigas, trabalhadas pelo tempo. não o desarrumado, desleixado, abandonado, coisas jogadas ao leo, como a expressão "jogadas ao leo", duvido que alguém ainda use isso. é frase de antigo, gente antiga, como eu.
gosto de casa antiga. sou alucinada por casas vitorianas.
tem pé direito gigante? tem móveis rústicos? já gostei. parede carcomida pelo tempo me dá um nó no coração. um nó bom. como assim? é uma nostalgia de alguma coisa que sequer vi, que nem cheguei a conhecer. mas me traz de volta (!???) um tempo onde tudo era diferente: a vida acontecia mais devagar, com mais intensidade.
não sei, é como se um poder de voltar no tempo me levasse de volta a uma época que não vivi. um passado que me atrai. e não sei explicar esse meu fascínio pelas coisas antigas. as casas velhas que rangem o piso de madeira. os telhados escuros que escondem histórias e pequenos segredos de alcova, sussurros intraduzíveis. pinturas descascando, jardins imensos com fontes de anjinho manchadas pelo tempo.eu sempre quis morar numa casa dessas, igual as casas dos vampiros. "casa de vampiro" era como eu chamava as casas antigas, espécies de castelos, que apareciam em filmes quando eu era criança. falando em filme também gosto de películas antigas. alguns dos meus filmes preferidos são ainda em preto e branco e tomara que continuem assim. entre eles: "os inocentes", "a malvada", "psicose". alguns são coloridos, mas antigos como "a dança dos vampiros","...e o vento levou", "o destino do poseidon", "dr. jivago". filmes antigos ou que mostram épocas antigas, como é o caso do "morro dos ventos uivantes", aliás, a primeira versão que vi era em preto e branco, depois as versões ganharam cor mas a magia não se perdeu. amo "drácula, de bram stocker" e uma infinidade de outros da mesma cepa.
tá decadente? gosto. tá envelhecendo? gosto. sou assim. das muitas cidades por onde andei as que mais me deram alegria em conhecer com certeza foram as que tinham passado pra contar. buenos aires, ouro preto, gramado. todas velhas, com pitadas de decadência em algum canto. o centro de são paulo também é lindo. e em porto alegre ainda há portas de madeira envelhecidas pelos séculos. tá, não posso ser injusta, salvador também tem bastante coisa antiga e linda, assim como valparaiso, no chile. a casa de pablo neruda é uma coisinha de louco. toda com divisórias malucas e um passado que se mantêm firme.
os mercados antigos, até as velhas senzalas e prisões. ah o passado...o passado é tão bonito pra mim, que mesmo sendo recente eu já gosto. no filme do "discurso do rei" uma das cenas que mais amei foi justamente quando o rei tá sentado num sofá velho com as paredes descascando atrás. aquilo é realmente lindo. lá no cassino, a praia onde passo minhas férias, tá cheio de casa antiga. e eu amo simplesmente passear entre elas. em rio grande existem casas que completam 200 anos e mais até. me perco com prazer naquelas ruas com casas de paredes escuras meio chapiscadas com cimento e pedras. um ar gótico romântico no ar. esse ar retrô me renova.
até árvores velhas são mais interessantes: se envergam com o tempo, endurecem com a sabedoria.
tudo meio decadente me inspira.
e hotel velho? ah o cheiro de velhice em hotel antigo é enebriante. uma mistura de passado, com proibido, mofo, cigarro impregnado, um quê de lascívia, uma coisa meio nelson rodrigues...hotel velho tem muita história. e não só o overlook, mas qualquer um.
adoro cinema com ácaro. guarda-roupa velho com roupa velha dentro. poderia ficar horas só olhando.
hoje fui até o final da w3 sul e na volta me acabei em pensamentos e lembranças. como a w3 sul está velha! mas o certo ar retrô é gostoso de se ver. tem até umas pousadinhas com cara de cidade do interior. acho que em alguns lugares o retrô tá exagerado: pistas esburacadas, calçadas mal cuidadas, prédios abandonados. mas ainda assim um certo ar de antiguidade está no ar. árvores grandes, prédios enormes com janelas sujas (janelas...ah janelas, ainda vou escrever um post só sobre janelas. é outro fascínio que tenho) tem restaurante antigo (hum, restaurante antigo também é bom, hein?), cardápio meio rasgado, mesas pesadas de madeira, garçom à moda 1.800.
e os pratos? adoro prato das antigas. arroz à grega, medalhão de filé. quer coisa mais demodé (a palavra demodé também é velha) que espetinho de sacanagem?
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espetinho de sacanagem: demodé e delicioso |
sacanagem é aquele salgadinho de salsicha, queijo e pepino em conserva ou azeitona. delícia antiga que não sai de moda nunca. assim como manjar branco, patê de sopa de cebola com creme de leite, canudinho recheado com sardinha e maionese. tudo comida de gente velha. hoje em dia é um tal de comida macro não-sei-o-quê-bio-não-sei-das-quantas. bolinho de chuva é coisa antiga, e eu amo. fazer tricô e tomar café com bolinho de chuva. coisa de gente velha e eu adoro.
fora bebidas antigas, como ferrão, batida de côco, campari, san remy, o vinho, que quanto mais velho melhor.
móveis antigos. a geladeira "frigidair" branca que ainda resiste ao tempo e o relógio cuco de estimação.
quer coisa mais linda que espelho veneziano? e abajour lilás? mais do que plínio marcos , um retorno ao passado decadente de muitas putas das antigas. adoro.
mas sim, falava eu da w3 sul, velha, decadente e ainda sedutora. com seus botequinhos de cidade do interior. lojas que "não se usa mais". já ouviu falar na expressão " não se usa mais"? é como dizer "não existe mais", "tá fora de moda". não se usa mais pedir obrigada, por favor, com licença. poizé, também não se usa mais ir a loja na w3 sul. será? tem tanta loja legal, que não se vê mais
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w3 sul : 1968 |
por ai, como aquela que aluga roupa pra homens que vão casar, ou a outra que tem tudo de artigos para festas, e aquela só de antiguidades.
tô pensando aqui, que na verdade o que não se usa mais, aliás, é ser educado e gentil.
sou tão das antigas que sinto falta de quando as pessoas eram mais educadas, mais cordiais, mais preocupadas umas com as outras. a preocupação é aquela boba, que a pessoa queria saber se o outro estava bem e não a preocupação que gera fofoca, aquele simples olhar pra vida alheia somente pra dar pitaco.
é...definitivamente estou ficando velha. velho é que fica ruminando o passado, né? então, outro dia estava pensando que se eu pudesse voltar no tempo, eu voltaria para que idade? decidi por voltar aos 14 anos. foi o começo da minha adolescência. eu até os 12 brincava de boneca. foi aos 14 que um belo dia fui dormir e me enchi o saco dos meus cabelos longos e bem tratados: meti a tesoura neles e acordei parecendo o chitãozinho (ou o xororó, nunca sei a diferença). eu criei um mulet enorme, um cabelinho arrepiado e sem saber o que fazer pedi ajuda pro meu pai, que consertou pra mim. foi ali que dei por definitivamente morta a minha infância. meus 14 anos. tudo novo, sentimentos novos, dúvidas novas, incertezas absolutas. tudo era uma grande descoberta. a paixão, o tesão, os amores. sim, aos 14 anos, o primeiro grande amor eterno (todos os amores são eternos aos 14 anos de idade). o primeiro porre, a primeira discussão. as primeiras bandeiras, as primeiras lutas. foi quando comecei a gostar de the cure e jurei de pé junto que eu era gótica. a atmosfera de mistério. essa coisa do passado de cemitério mal assombrado, coisas antigas que eu encarava com seriedade. aos 14 anos eu tinha uma pele linda, seios fartos e duros, uma ingenuidade apaixonante. eu achava que ia mudar o mundo. e tinha certeza que minhas convicções jamais seriam flexíveis. se eu pudesse voltar no tempo, seria lá pros meus 14 anos que eu iria agora. tudo ainda estava por se descobrir, um mundo cheio de novidades e cheio de sonhos a oferecer.
e o engraçado é que forçando a barra 14 é 41 ao contrário. faltam pouco mais de dez dias pra eu completar 41 anos e mais engraçado ainda é que, pensando bem, assim como aos 14 eu me sentia adolescendo, aos 41 me sinto envelhecendo. como diz mário prata, estou entrando na envelhecência. naquela fase pré-velhice. e vou dizer uma coisa, também é cheia de sentimentos novos, descobertas novas, dores novas, paixões novas. é um mundo ainda a ser explorado. igualzinho na adolescência. o ruim é que a pele não é mais a mesma, você descobre coisas novas no corpo sim: calos, bicos de papagaio, manchas, cracas. dores que você nunca sentiu, pelancas onde era tudo durinho, cabelos que somem, cabelos que aparecem. músculos que você nem sabia que existiam. ninguém prepara a gente pra adolescer, muito menos pra envelhecer, né? e eu que tenho tanto a fazer ainda. já plantei árvore, falta escrever um livro e ter um filho. não sei o que é mais difícil, de qualquer maneira, o auge da minha envelhecência ainda não chegou, mas já decidi que um dia vou morar no hermenegildo, a última praia do mapa no rio grande do sul, um lugar esquecido do mundo. quero sentir o vento me assustando, fantasmas sussurrando, a solidão se encostando. quero ser uma velha morando na casa da bruxa, cercada de crianças felizes, assombrações antigas, luzes, cores e música antiga. meus cabelos com certeza vão ser azuis ou verdes e se as dores deixarem, quero caminhar na praia com meus cachorros e sentar pra ver o por-do-sol se minguando nas dunas. na minha velha casa aconchegante quero esquentar os pés numa lareira, fazer pão pra criançada e sentar pra contar histórias. falar do meu tempo, das coisas antigas, das coisas que "não se usa mais". quero contar como eram os namoros antigos, a falta de ar que dava a expectativa de encontrar com o amado, as pernas que tremiam só de ele dar oi. contar pras meninas que um simples toque da mão da pessoa querida traz mais eletricidade e prazer que uma gozada ensaiada com um qualquer desconhecido. quero contar como eu consegui cada uma daquelas tatuagens já apagadas pelo tempo e lembrar de cada suspiro de amor que já dei na vida. quero ser a velha das antigas que fica profetizando que algumas coisas nunca vão sair de moda: a delicadeza, a gentileza, o abraço, o beijo. quero contar, quando eu for bem velhinha, que um dia o mundo foi mais bonito. ou não. vai que daqui pra lá o ser humano evolui um pouquinho, né? afinal como diria cecília meireles " hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem e que amanhã recomeçarei a aprender"...a vida é um eterno recomeço...
p.s- importante dizer que não vivo só do antigo e só de passado. quem vive de passado é museu. por isso estou sempre me atualizando, pra conseguir valorizar o velho e saber que daqui a um tempo o novo vai virar relíquia também...
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quero ser a velha morando na casa da bruxa |